Tão Longe Do Fim

Como traduzir em texto uma coleção que passou dois anos em processo de criação e desenvolvimento?!



Comecemos pelo começo: um caso do acaso, bem marcado em cartas de tarô. Seguido por uma busca (fracassada) por um respiro de brasilidade no Rio de Janeiro antigo. Nada contra a brasilidade Carioca! Até temos colegas que trabalham sobre ela. Mas não é o Nosso lugar de Brasilidade. Depois, uma coleção em crescimento desenfreado de Orquídeas Tropicais exóticas. E uma tentativa frustrada de ler Baudelaire para justificar um amadurecimento de Victor Belchior... à época, existia a ideia de a coleção seguinte a Menino-Flor se chamar "Outras Flores". Mas, ao mesmo tempo que nenhuma inspiração se consolidava enquanto embasamento conceitual de uma nova coleção para um novo Victor Belchior, a tal da coleção continuava a crescer, juntamente com o incômodo da tal busca por uma Brasilidade escancarada na Marca.

Até que um dia apareceu na playlist de academia Tetê Espíndola. E tudo fez sentido: a música inspira Victor Belchior. E ao longo de todo o processo criativo, a música brasileira dos anos 1980 embalou os dias de ateliê. A coleção foi então dividida em três partes, e cada uma teria a atmosfera construída ao redor de um clássico da MPB da época. Mas ainda não estava perfeito, não fazia sentido deixar a música da minha vida para o final se ela era uma constante. Tinha que ser tudo sobre ela.



Ainda, é importante lembrar que viemos de um período peculiar, um ar de hiato, a sensação de que tínhamos mandado tudo pr'aquele lugar e fugido pra Shangri Lá. Mas não, muito pelo contrário! Estamos mais vivos do que nunca, com sede de mais, afim de dividir, no fundo do prazer, O Amor e o Poder.

Sim, O Amor e o Poder é a canção de minha vida. Porque eu nasci, cresci e continuo ouvindo essa música quase que (se não) diariamente. Esses dias, brinquei no ateliê que muito provavelmente minha mãe cantou a tal "Como Uma Deusa" enquanto tomava banho logo após a minha concepção. E pelo menos uma vez ao dia em todos os dias subsequentes. E, a partir dos meus 8 anos de idade, todas as vezes que o aparelho de karaokê era ligado nas reuniões de família. Acho inclusive que só fui ouvir a versão original anos mais tarde, quando já tínhamos internet discada em casa.


Então era isso: minha brasilidade vem de cantar Rosana Fiengo no banho, do disputadíssimo karaokê nos churrascos de família, d'O Amor e d'O Poder.

Estamos tão perto das lendas, e tão, mas tão...
Victor Belchior: tão longe do fim

Tão Longe Do Fim